Há um discurso muito comum, visto entre os adeptos do
humanismo (em especial, os que se envolvem com questões de Saúde Mental), de
que os diagnósticos psiquiátricos sejam meros rótulos, cuja função seria
despersonalizar o sofrimento alheio e enquadrá-lo em um modo de medicá-lo. Em
verdade, o que pode ocorrer é cairmos em uma armadilha conceitual que criamos
em torno de um discurso pré-definido por nossa comunidade acadêmica: o modismo
de ser contra a todo e qualquer discurso psiquiátrico no campo da saúde mental.
Antes de
continuarmos, é importante que fique claro que não adentraremos no campo
conflituoso das políticas de intervenção em Saúde Mental. Mas se fazia
necessário explicar como o “senso comum acadêmico” tem se posicionado de modo
preconcebido (preconceituoso), sem se por a crítica ás críticas feitas a
determinadas práticas. É fato que há muito o que se discutir quanto validade ou
não da psiquiatria, mas este assunto envolve muitos poderes
político-econômicos, que não é foco desta coluna. Deixo a cargo dos colegas.
O diagnóstico psiquiátrico pode tanto servir de instrumento
de controle, manutenção ou assistencialismo social, como emancipação dos
sujeitos frente ao seu sofrer, a indeterminação do que se sente/sentia. A
questão é: como nós lidamos com este fenômeno de diagnosticar?
Uma faca não é nem boa, nem ruim. Uma faca é um instrumento
de metal com cabo de madeira, geralmente. Porém, seu uso é diversificado por:
1) quem o utiliza; 2) quando o utiliza; e, 3) para que o utiliza. Uma faca,
deste modo, pode ser entendida como arma braça cortante e perfurante, muito
utilizada em furtos e atos ruins para a sociedade, como pode ser entendida como
um utensílio doméstico que auxilia uma mãe/pai no preparo de alimentos para a
sua família. Então, compreendendo que não podemos dar um
valor/sentido/significado a priori
para um objeto no mundo, como a faca, poderíamos dizer que o diagnóstico é uma
forma de rotular as pessoas e torná-las, pura e simplesmente, em
personificações de sua doença? Acredito que não.
O que devemos fazer é uma epoché frente aos atos de diagnosticação feitos nas
instituições. Epoché é uma postura
que devemos tomar frente aos fenômenos do mundo para compreendermos estes de
modo menos preconcebido possível. Seria a suspensão dos nossos valores a priori para compreendermos o fenômeno
mesmo, que se dá ali, ser aí, e não como repetição do que já foi vivido. Em
outras palavras, devemos compreender como o diagnóstico influencia na vida do
sujeito e como é feito nas instituições. Não há como prevermos 100% se este é
usado como instrumento norteador das ações profissionais (de modo coerente,
político e ético) ou se é apenas uma manutenção do sistema institucional (catalogar
em tabelas e gerar dados ao governo) sem um projeto terapêutico.
Devemos entender o
diagnóstico, não como um mero rótulo, mas como um norteador das ações
profissionais dentro de uma instituição. O diagnóstico deve ser tratado junto
ao usuário como instrumento técnico-conceitual dos profissionais e não como
identidade a que eles (usuários) devem estar submetidos. É apenas uma
“fotografia” de um determinado momento da vida de um sujeito e não uma
constante que deve se perdurar em seu existir. Mesmo que o diagnóstico não
identifique a história de vida singular de um sujeito, ela pode auxiliar o
profissional em seus métodos interventivos, sem que este tenha um mínimo de
preparo para com o usuário.
Como já foi dito, o
diagnóstico é um norteador para o profissional, não um modo de vida para o
usuário (identidade). O diagnóstico deve ser um meio de instrumentalizar o
profissional, uma forma pela qual ele poderá buscar auxílio em literatura da
sua área que trate do assunto e/ou re-experimentar suas experiências de
intervenção anteriores. Mesmo que a postura de suspensão dos valores (epoché) seja importante para compreender
a singularidade do diagnosticado, é preciso que o profissional tenha um suporte
interventivo. Não adianta somente compreender os fenômenos, é preciso que
sejamos profissionais aptos a promover ações transformadoras na vida dos
usuários.
Concluindo, o diagnóstico não é o monstro que pintam, nem
pode ser visto de modo naturalizado. O diagnóstico é uma ferramenta em Saúde
Mental e como toda ferramenta, seu uso depende de nossas ações. Saibamos o que
fazer, quando fazer e, se preciso, nos desfazer deles. O diagnóstico é um campo
interdisciplinar, logo político. Tenhamos responsabilidade no exercício de
nossa profissão. O diagnóstico pode ser um ato médico, mas que não deixemos de
dialogar com estes e propormos conjuntamente com estes formas de intervenção
transformadoras. Não nos fechemos em nossas perspectivas psicologizadoras do
mundo. Transformemos os instrumentos que nos transformam!




Ja recebi um duagnostico psiquiatrico que deixou minha mae de cabelo em pé, ela sem saber achou q eu era louco por ter recebido diagnostico f-60, transtorno de personalidade..... na epoca eu estava agindo como tal, nao que eu seja pra sempre. nao assumi essa identidade de f-60, hoje depois de tratamentos e psicoterapia tenho uma vida social normal.
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